28 de setembro de 2005

As meias de Itsa


Quando ele vinha caminhando em minha direção seus olhos e seu sorriso me enchiam de alegria. Sei que é bobo dizer isto, mas me sentia assim nestes momentos. E não é bobo dizer aquilo que temos certeza de sentirmos. O amava em pequenas fantasias. Tinha medo. A certeza de que ele amava com muita suavidade me encantava. Eu sabia, o toque seria suave. Talvez não precisasse nem ao menos do toque e ainda assim sentiria a leveza de seus dedos acariciando meu rosto. As fantasias aumentavam. O foco não era mais eu. Era a suavidade que ele possuía e que eu amava, transparente para meus olhos. Pensei, tudo afinal se resume em entender o amor. Que finalidade deseja impor em nossa alma? Não sabia.
Começaram a se encontrar. Falava pouco e, no entanto, olhava-me estranhamente quando vestia minhas meias. Assim como toda aquela suavidade me encantava, sabia que ele amava aquelas flores pequenas bordadas com tanto cuidado pela minha avó.
Ficava olhando Itsa tirar toda a roupa. Depois abria a bolsa a tiracolo e tirava de dentro o mesmo e sempre par de meias: de crochê bege com pequenas flores vermelhas. Menores que seus minúsculos pés. Então eu observava Itsa vesti-las. E eu fazia parte de sua intimidade. Ela, quase completamente nua, se não fosse pelas meias que usava. Perguntava a mim mesmo: e quando elas furassem, rasgassem, tivessem o fim que todas as meias têm um dia. O que Itsa faria? Compraria outro par, já não mais com flores vermelhas? Pediria para sua avó costurá-las? Não. Não havia mais avó. E Itsa não sabia costurar_ meias que fossem. Talvez não me quisesse mais quando as meias chegassem ao fim. Itsa tinha, realmente, uma intimidade que não compreendia.
Artur, então, rezou para que o crochê tecido fosse forte, resistente. Gostaria de ver aquelas flores vermelhas ainda por muitas primaveras.

Anna K. & A Adoração por Meias de Crochê