3 de setembro de 2005

Ravel

Procure constantemente um ‘algo’ durante a vida para que, daqui um tempo quando o fores fazer novamente, possa sentir o prazer de volta pelo que já havia feito antes. Acho que ele tem razão. A vida talvez seja isso. Tornar a fazer para relembrar o sentido mais uma vez pela repetição de outra vez. Hedonismo? Talvez. A certeza de que sou eu mesma ainda, me conforta. Triste não ter me despedido. Em outras circunstâncias talvez me despedisse. Não suporto ficar enquanto algo parte. Ou alguém. Somos uma legião em busca de equilíbrio. Rainer Maria Rilke disse certa vez: ‘confesse a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever?’ Sim, não, talvez. Mais coisas a relembrar e menos a supor ou a imaginar. Como quem monta um minúsculo navio e relembra que já sentira prazer em fazê-lo tempos atrás. Palavras distribuídas. Convido alguns para entrarem. Isto foi o muito que ficou. Desculpe, ia esquecendo. Ficou o botão do seu paletó dentro do meu carlton low star. Apesar do hotel várias estrelas — sem encontrar agulha e linha — devolvê-lo ao seu lugar de origem foi impossível. Sei que continuará vestindo o paletó cinza escuro com jeito de verde-musgo — mas não de casaco de astracã, pois onde mora não faz frio — e faltará sempre o botão no seu lado esquerdo_ não atrapalhará em nada sua serenidade ao montar outro ravel.

p.s. 1: montar ravel_invenção do nosso inconsciente. Relembrar não seria uma espécie de projeção daquilo que já sentimos? Foste uma projeção de algo muito bom. Gostaria de saber do quê. Como não nos é dado saber essas coisas — regra geral para todos — deixo um abraço demorado e um rápido beijo no canto direito da boca.
p.s.. 2 : estou aprendendo a montar raveis.